TRÊS HORAS

domingo, 18 de abril de 2010 19:58 Postado por Nenhuma Palavra
Você levanta às três horas da manhã e não consegue mais dormir até as seis. Um repentino desgosto sobe do seu estômago até a garganta, um frio tão imensuravelmente frio que não passa. Você está febril? Não... não tem vontade de levantar pra ver. Tanto faz... Os pensamentos incômodos passam pela sua cabeça como se sua mente quisesse te castigar, como se houvesse um homenzinho ali dentro que te cutuca sempre que você não precisa ser cutucado e repete, e sussurra, na beirinha do ouvido: O-t-á-r-i-o.



Sabe, às vezes a vida te caleja. Te deixa frio; tão ou mais frio que os frios daquelas noites. E ai... bom, ai você deixa de sentir. Desconfia, desacredita, dá risada. Tanto que fica absolutamente imune a qualquer tipo de notícia... inexpressivo, calado, com uma pedra no meio do seu peito. Você não vai rir... e também não vai chorar. Porque embora o homenzinho fique te sussurrando repetidas vezes o que você é, foi e sempre será, algumas pessoas só o são, realmente, uma vez. Uma vez de cada vez.


É... a vida te caleja. Caleja ao ponto de você não fazer pelas pessoas o que elas não fariam por você. Sim, talvez esse processo deixe a gente um pouco mais primata do que ser humano. Animalize... Já que a vida virou uma selva, devemos mesmo é ser selvagens... Devemos...devemos dormir... Não! Acordar! E lutar contra isso, LEVANTE-SE!


Não. Você mexe o braço, quer mexer o braço, pensa no braço mexendo... mas ele não se move. São três horas da manhã e você não consegue dormir até as seis. Um desgosto subindo, uma ânsia, aquela náusea... há quanto tempo você não come? Abra seus olhos, rasteje até a cozinha... Mas a única coisa que não te faz vomitar é uma garrafa de vodka russa... O-t-á-r-i-o...


É dificil levantar quando o chão cospe na sua cara e vai embora. O que foi que você fez mesmo? ... Nada. Mas a culpa é sua, sempre foi sua, tem que der sua... deve ser sua. Você está alucinando? Não... é real, quem dera fosse ilusão. Você poderia se sentar novamente na cadeira de um bar, poderia sorrir de novo, rir de tudo isso. Você está em estado de choque.


Se arrasta de volta pra cama com a tal da vodka russa, bebe tudo sem dó. Inconsequentemente. Talvez faça passar esse frio... como é mesmo o frio? Ah, sim... era aquele frio que vinha de dentro, te fazia tremer... claro, escuro, claro, escuro... seus olhos fecham. Agora é só escuro.


Você levanta as três horas da manhã e não consegue mais dormir até as seis... Mas chega um dia que a vida te caleja... e ai? Ai você deixa de sentir.






por Aline DeMarco

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